Pesquisadores estudam a musicalidade da fala para tratamento de portadores de autismo

7 de junho de 2018 - 15:03

Mesmo quando não falam, as pessoas portadoras de autismo mantêm relação com o mundo a partir da interação de como a linguagem chega até elas. A partir desse olhar, se tornam mais claras a escuta e a compreensão desses indivíduos quanto aos seus anseios, suas necessidades e sua inclusão social e educacional, ajudando na orientação de tratamentos.

Nessa perspectiva, o trabalho de um grupo de pesquisadores coordenado pelo professor Luis Achilles Furtado, do Curso de Psicologia da Universidade Federal do Ceará (Campus de Sobral) busca investigar o modo como os autistas se relacionam com a linguagem e, portanto, se constituem como sujeitos.

A base do estudo é a musicalidade da fala como instrumento para ajudar os portadores de autismo em relação à sua comunicação. Para isso, o grupo de cientistas usa, como referência para a análise, registros reunidos através da literatura especializada e da experiência clínica de extensão e ensino na universidade. O trabalho conta com o apoio da Funcap através do Programa de Bolsas de Produtividade em Pesquisa, Estímulo à Interiorização e à Inovação Tecnológica (BPI).

De acordo com os pesquisadores, pessoas com autismo apresentam um modo específico de falar, mantendo um ritmo e entonação mais ou menos constantes, apagando assim as sutilezas da enunciação no ato da fala. Essa distinção deu origem à união da pesquisa com  a dimensão musical presente na linguagem, o que no amparo da perspectiva do psicanalista francês Jacques Lacan se enquadra em um conceito definido como lalíngua.

A lalíngua, segundo Lacan, é a relação primordial do sujeito com a linguagem no que ela tem de material sonoro e equívoco, desprendida do significado. Trata-se das primeiras manifestações das pessoas na relação com os outros, ou seja, referem-se aos primeiros balbucios desconexos de sentido de fala que irão, através do efeito da musicalidade presente nesse ato (timbre, ritmo e volume), expressar questões subjetivas do indivíduo e contribuir para as primeiras relações de afeto entre a criança e a mãe. Para as crianças com autismo, há uma sensibilidade maior em relação à musicalidade da fala. Os resultados obtidos pela pesquisa apontam para a importância de considerar as particularidades presentes em cada língua e na forma como cada um a recebe e a incorpora, favorecendo tanto a direção do tratamento quanto a educação dos sujeitos diagnosticados com autismo. A partir das individualidades é definido o acompanhamento a ser realizado, respeitando as diferenças subjetivas de cada um.

“É uma pesquisa de cunho teórico que tem ajudado na orientação da extensão. Os resultados servem para discutir e orientar os casos clínicos”, afirma o professor Luís Achilles. Segundo ele, estes resultados são de grande utilidade para o campo da clínica psicanalítica, para as redes de saúde mental e para a educação inclusiva. Além disso, a pesquisa já apresenta contribuições para a efetivação das diretrizes da Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, estabelecida pela lei federal nº 12.764. Ela prevê a participação da comunidade na formulação das políticas públicas voltadas para os autistas e assegura a eles atenção às necessidades de saúde.