Pesquisador faz estudo sobre urbanização e meio ambiente do litoral de Fortaleza

16 de outubro de 2009 - 18:56

Da Agência Funcap

Por Sílvio Mauro

Apesar do ritmo intenso de ocupação da faixa litorânea da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), ela ainda contém áreas muito bem preservadas. É preciso, no entanto, adequar os planos diretores dos municípios que a compreendem (Fortaleza, Caucaia, Aquiraz e São Gonçalo do Amarante), à nova realidade de grandes empreendimentos imobiliários e obras estruturantes que estão previstos ou sendo instalados, para que seja garantida a conservação dessas áreas remanescentes.

Essas são algumas das conclusões obtidas com o estudo realizado pelo pesquisador Almir Farias, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo (DAU) da Universidade Federal do Ceará (UFC). Ele analisou, durante cerca de dois anos, os planos diretores dos municípios da RMF que têm zona litorânea, o processo de ocupação dessa área a partir de 2000 e as políticas e a legislação de desenvolvimento urbano das três instâncias (federal, estadual e municipal). Ao todo, a área estudada compreende cerca de 110 km de costa.

O trabalho “Urbanização e meio ambiente em zona litorânea metropolitana” recebeu apoio da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap) através do Programa Primeiros Projetos (PPP). De acordo com o pesquisador, ele tem, entre seus objetivos, oferecer contribuição para os estudos de planejamento urbano e regional e fornecer soluções práticas para solucionar problemas urbanos e ambientais em litorais metropolitanos para agentes públicos e privados com interesse na área.

Um dos aspectos observados no estudo, segundo ele, é que Fortaleza teve um modelo particular de ocupação, em relação a outras grandes capitais litorâneas: a predominância de urbanização popular e espontânea da orla. Enquanto em um setor da área leste da cidade, onde ficam bairros como Meireles, Praia de Iracema e Aldeota, se concentrou a parte mais nobre, no setor oeste, na faixa que vai da Barra do Ceará à Escola de Aprendizes Marinheiros, no bairro do Jacarecanga, os primeiros moradores foram pessoas que vieram do interior fugindo da seca e acabaram naquela área por falta de opção (e de interesse do mercado imobiliário por ela).

Essa faixa de litoral – diferentemente do setor nobre – cresceu sem nenhuma infra-estrutura urbana e só recentemente começou a receber mais atenção dos órgãos públicos. É lá que fica o projeto Vila do Mar, da Prefeitura de Fortaleza, que irá remover casas de áreas de risco e construir uma nova avenida litorânea. Para o pesquisador, essa ocupação histórica feita pela população de baixa renda deve manter algumas peculiaridades, mesmo com a intervenção do poder público. A previsão do pesquisador é de que não deve acontecer o mesmo processo de verticalização do litoral leste.

“Acho pouco provável, porque os moradores estão muito articulados. Se houver alguma tentativa nesse sentido, deve haver resistência”, afirma. Ele lembra, ainda, a expectativa de que essa área, junto com o bairro Serviluz, no começo da Praia do Futuro, seja definida como uma das Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis), o que deve ajudar a impedir (ou ao menos dificultar) a especulação imobiliária.
Sobre a especulação, o estudo realizado apurou que ela tem sido a prática mais freqüente na ocupação do litoral da RMF. “Há um modelo muito perverso. Localidades como Porto das Dunas e Pecém estão em um processo predatório que avança sobre dunas, lagoas e áreas de preservação”, ressalta Almir. Outro problema detectado, de acordo com ele, é que o expediente mais corriqueiro é o de privatização da orla, sem que sejam deixadas faixas de área livre. Ainda na área do Pecém, o pesquisador afirma que, quando foi projetado o complexo industrial e portuário, uma área de preservação foi definida no entorno. Mas já há registros de ocupações irregulares.

Marco regulatório existe, mas fiscalização e integração precisam melhorar
Um dos objetos de análise da pesquisa foi o Projeto de Gestão Integrada da Orla Marítima (Projeto Orla), uma iniciativa conjunta de estados, municípios e dos ministérios do Meio Ambiente e do Planejamento, Orçamento e Gestão que busca ordenar os espaços litorâneos sob domínio da União. Na avaliação de Almir Farias, no que se refere à definição de políticas públicas e legislação, o litoral está bem assistido. O que precisa melhorar é a integração entre as instâncias (federal, estadual e municipal).

“Falta, em particular, uma instância supralocal de planejamento metropolitano. O equilíbrio entre urbanização e meio ambiente somente será alcançado se considerarmos a zona litorânea como um território contínuo, sintonizando os projetos estruturantes municipais a partir de princípios comuns”, afirma. Ele lembra, por exemplo, que o Projeto Orla só foi realizado, até o momento, em Fortaleza, não havendo previsão em relação aos outros municípios da RMF.

Para o pesquisador, houve avanços no que se refere ao marco regulatório e à criação de diferentes mecanismos de controle direto, mas alguns entraves ainda persistem. Sobre a legislação, por exemplo, ele ressalta que não faltam regras definindo espaços como áreas de proteção e reservas extrativistas. “É impressionante a quantidade de leis e projetos”, diz o pesquisador. Almir também lembra que foram criados conselhos municipais e estaduais. “O problema é a atuação irregular e pouco mobilizadora. A população não chega a saber das decisões dos conselhos e muitas denúncias caem no vazio”.

Por fim, Almir Farias destaca que a gestão urbanística e ambiental e a fiscalização no cumprimento das leis deveriam considerar toda a complexidade dos diferentes ecossistemas. Ele afirma que um resort, por exemplo, quando vai ser construído, diz que vai reservar 45% do terreno para áreas verdes. Mas não são levados em conta a fauna, a flora e os recursos hídricos que se estendem pelo entorno e vão além da delimitação do lote. “Não dá para pensar nessas regiões isoladamente”.