Dia Mundial da Água: no Ceará, a luta ainda é contra escassez histórica

18 de março de 2009 - 17:07

Publicada em 18.3.2009

Da Agência Funcap

Por Sílvio Mauro

Poluição ambiental, aumento do nível dos oceanos por causa do aquecimento global. Em todo o mundo, esses temas voltam a entrar em evidência por causa do Dia Mundial da Água, celebrado no dia 22 de março. No Ceará, no entanto, a preocupação maior continua sendo com a capacidade de armazenamento da água doce. Apesar dos progressos obtidos, principalmente nos últimos 20 anos, com a construção de grandes reservatórios, o estado ainda sofre por causa de problemas históricos relacionados principalmente com as chuvas e a qualidade do solo.

De acordo com Manoel Sales, gerente de pesquisa da Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece), por serem localizados em um estado pobre, sem grandes conglomerados industriais, os mananciais cearenses não apresentam problemas graves de poluição causada por produtos orgânicos ou inorgânicos. Por conta do Dia Mundial da Água, a empresa mostrou a jornalistas, essa semana, o processo de tratamento em uma das suas principais estações, a ETA-Gavião.

“A maior dificuldade do nosso ambiente é o alto nível de insolação. Isso contribui para a proliferação de algas e o aumento da salinidade”, explica. Ele acrescenta, ainda que o clima quente do Ceará também ajuda na proliferação de microrganismos, o que dificulta e encarece o processo de tratamento da água que será distribuída para a população.

Hoje, a maior parte do consumo humano da água no Ceará (cerca de 60%) está concentrada na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Manoel Sales assegura que a posição do estado está relativamente confortável, por causa de medidas para interligar os principais reservatórios do estado e do nível atual de todos eles. No entanto, ele não descarta a possibilidade de que, a partir de 2015, seja necessário importar água para atender o crescimento da demanda.

Sem grandes reservatórios subterrâneos (a única exceção fica por conta de um aqüífero que abastece a região do Cariri, na zona sul do estado), o Ceará depende dos açudes e das chuvas para ter água. Com uma média anual de 650 a 700 mm de precipitação, o estado não está entre o que apresenta os índices mais baixos do Brasil. Segundo José Maria Brabo, da Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), existem áreas no interior da Bahia, por exemplo, onde ele é próximo de 350 mm anuais.

O problema do estado, na sua avaliação, é uma combinação de fatores. O primeiro é a concentração das chuvas em apenas quatro meses por ano. “É um período muito longo de escassez”, diz. Aliado ao solo cristalino (rochoso), que dificulta a penetração, e o alto índice de evaporação por causa de vários meses de sol, o resultado é uma grande dificuldade para armazenar a água. “Por isso que o Ceará só tem um grande rio, no interior que foi perenizado. O Jaguaribe, que tem água o ano todo por causa do açude Orós”.

A cultura da armazenagem e a rejeição ao cloro

É comum ver em filmes feitos nos Estados Unidos e na Europa os personagens tomando água direto da torneira. No Brasil – e no Ceará, em especial – esse expediente não é muito aceito. Manoel Sales, da Cagece, assegura que a água tratada distribuída pela empresa é potável e não precisa de filtragem ou qualquer outro processo de purificação para ser consumida.

O problema, segundo ele, é que, por causa da tradição de falta de água existente no estado (durante anos, inclusive, houve deficiência no processo de bombeamento, por causa da escassez, e a água não chegava a regiões mais altas de Fortaleza com facilidade), criou-se uma cultura de guardar água em caixas e cisternas. “Esses reservatórios nem sempre são limpos com a freqüência devida. Isso é que traz o risco”, afirma.

Outro fator cultural interessante, segundo o técnico da Cagece, é a rejeição, por parte dos consumidores, ao gosto e ao cheiro de cloro da água fornecida pela empresa. Ele assegura que isso, ao contrário, é um sinal de pureza, já que a adição do elemento químico é uma recomendação da Organização Mundial de Saúde para combater a proliferação de microrganismos. “Quando eu sinto gosto de cloro na água, fico aliviado”, garante.